No dia seguinte.
“Dia…”
Nina esfregou os olhos com sonolência enquanto falava, abrindo a boca para bocejar.
“Bom dia.”
Ainda tentando não olhar para seu corpo nu, eu a cumprimentei em resposta.
“Eu ainda estou cansada… você estava muito barulhento a noite passada…”
“Sinto muito.”
Reclamando, ela estendeu as mãos e as árvores chacoalhavam enquanto inclinavam suas folhas para ela, fazendo com que o orvalho caísse nas palmas de suas mãos. Uma vez que Nina terminou de lavar o rosto, o vento soprou a água restante em sua cara. Então, a seda que tinha sido jogada no ramo da árvore flutuou em direção a Nina, envolveu seu corpo e se tornou suas roupas.
Como sempre, a magia é uma coisa magnífica.
Eu decidi chamar sua raça de elfo por conveniência. É apenas por conveniência porque, independentemente de suas habilidades, seu estilo de vida ou características físicas, diferiram muito do desenho traçado pelo grande escritor do século XX chamado Tolkien[1], mesmo que diferiam da variedade de elfos que existiam dentro da Mitologia nórdica, os álfr.
[1] NT: John Ronald Reuel Tolkien, autor dos livros “O Hobbit” e “O Senhor dos Anéis”.
Suponho que poderia ter sido mais preciso chamar-lhes de dríades ou ninfas, mas não há motivo para coincidir com a mitologia da Terra. Ela vive neste mundo e é uma existência deste mundo, afinal.
“Então, o que você estava pensando? Uma academia?”
“Sim. Eu gostaria que você me ajudasse a construir uma, Nina.”
Arranjando seus cabelos dourados com folhas de grama, ela me perguntou sobre o que eu trouxe na noite passada.
Eu assenti- sua cooperação era imperativa para a academia que imaginava.
“Eu realmente não me importo.”
Os elfos pareciam viver vidas muito monótonas.
É também por isso que ela estava se associando a um dragão estranho como eu. Eu também acredito que é porque isso significava que ela poderia viver sem ter que trabalhar.
“O que é essa academia, afinal?”
“Uma academia é um lugar onde você vive durante muito tempo, um lugar para ensinar os jovens sobre o mundo. Seus pais te ensinaram sobre o mundo, certo?”
“Bom, sim.”
Inclinando a cabeça para o lado enquanto se lembrava de seu passado, ela concordou.
“Os seres humanos são uma raça muito mais jovem que a sua. Quando se trata do que precisam para sobreviver, eles não sabem quase nada. Eu vou construir uma academia de magia e ensinar-lhes magia. ”
“… Magia?”
A magia era outra palavra que não existia em Élfico. Nina repetiu a palavra que eu havia falado em japonês.
“Nina, você sabe como você lida com árvores? Isso é magia.”
“Eh-”
Seus olhos se arregalaram de surpresa.
“Ensinar, você diz … como?”
Parecia que ele não tinha idéia de como isso poderia ser feito.
“Nina, como você faz isso?”
“Como…?”
Dizendo isso, Nina olhou para uma árvore e estendeu seu braço para ela.
A árvore rangeu e se moveu para colocar um ramo em sua palma quase exatamente como se ela lhe tivesse dado uma ordem de [Agitar] como se poderia dar a um cachorro.
“Então.”
Nina franziu sua testa, preocupada. Não tinha mais explicações para me dar.
Entendo. Suponho que para ela, mover árvores é como mover seus próprios membros.
“Então, você ficaria intrigado se eu lhe perguntasse como você respira fogo, não?”
“Ah. Então, isso também é magia.”
Era bem óbvio agora que penso nisso. A respiração é algo que é feito para absorver o oxigênio, como eu poderia fazê-lo se meus pulmões estivessem cheios de fogo? É simplesmente impossível. Então, obviamente, isso também deve ser magia.
Mas ela está certa. Não poderia explicar como respiro fogo. É como respirar normalmente para mim. Eu nem sinto o calor disso. Esse fato me faz esquecer que eu respiro fogo.
“Nina. Você pode mover os braços sem mover as árvores junto com eles?”
“Sim.”
Quando pensei em algo e pedi a Nina que tentasse, ela rapidamente levantou o braço. Como esperado, aparentemente a ação em si não é o requisito para isso. Em outras palavras, eu deveria ser capaz de respirar fogo e não respirar fogo.
“Você poderia tentar movê-los agora?”
“Claro.”
Desta vez, Nina apenas olhou para eles sem mudar sua postura.
Um ramo de árvore torceu, tremendo para cima e para baixo.
“O que você fez de diferente?”
“Umm, eu… eu imaginei isso?”
Então é tudo sobre a imagem, certo? Vamos tentar.
Fechei meus olhos e imaginei-me antes de reencarnar, quando eu ainda tinha o corpo de um humano.
Um corpo em pé de duas pernas. Costas sem asas. Um pescoço reto.
Eu respirei devagar, o ar me encheu.
Então, mantendo essa imagem na minha cabeça … Respirei.
“Kyaah!? O que você está fazendo!?”
“Ah! Sinto muito!”
Em pânico, comecei a apagar as chamas que começaram a se espalhar nas árvores.
Parece que não será fácil.
***
A lenha estalou, fazendo barulho.
“Então você come carne, eh…”
“Hmmm? Disse alguma coisa?”
Nina estava mordendo uma carne de veado assado, desfrutando imensamente seu sabor.
“Você não acha que é lamentável ou algo assim, certo?”
“Eh?”
Ao ouvir minha pergunta, Nina inclinou a cabeça para o lado e respondeu como se eu tivesse acabado de dizer algo estranho.
“Oh, sinto muito. Não é nada.”
Acho que essa é a resposta normal? Esse tipo de pensamento é algo que apenas as sociedades mais abundantes teriam. Mas é realmente surreal ver um elfo delicado devorar vorazmente um pedaço de carne assada.
Eu digo isso, mas estou ainda pior em termos de sofisticação.
Ter um corpo de dragão mudou meu senso de gosto, então coisas são deliciosas, mesmo que sejam cruas.
Sucos saem da carne quando são queimados pelas chamas na minha garganta. É extremamente delicioso.
Mastigando carne de cervo, pensei em magia.
Parece que a magia deste mundo não é algo que exige encantamentos ou movimentos para invocar. É tão natural como a respiração.
Ser capaz de manipular livremente algo que eu compararia a um braço imaginário é difícil.
Ao ver as flores que de alguma forma conseguiram não queimar, eu retive meu desejo de suspirar.
Eu poderia chegar ao ponto de poder mover livremente minhas asas.
Eu não tinha asas ou cauda quando eu era humano, então elas eram coisas desconcertantes para mim quando eu nasci.
Mas eu me acostumei com elas depois de alguns anos, eu nem sequer sinto desconforto agora. Agora eu posso usá-las tão naturalmente quanto eu posso usar minhas mãos.
… Hmm?
De repente eu questionei meus próprios pensamentos.
… É realmente como mover um braço imaginário?
Agora eu tenho asas para que eu possa voar através dos céus, escamas para proteger meu corpo e presas para que eu possa mastigar veados inteiros.
Sim, é assim…
Não há também algum órgão dentro do meu corpo para que eu possa respirar o fogo?
Fechei meus olhos mais uma vez.
Desta vez, não me imaginei como humano, mas como dragão.
Onde é a fonte do meu fogo?
Na minha garganta?
Não. A carne de veado que comi antes foi queimada mesmo depois de passar pela minha garganta.
Então está em meus pulmões?
Mas as chamas ainda cintilam da minha boca, mesmo que eu pare de respirar.
Nesse caso… no meu abdômen? No momento em que pensei sobre isso, senti algo estranho.
Como se houvesse algo quente localizado perto do meu estômago.
Me imaginando bloqueando isso, olhei para baixo e exalei.
As flores que floresciam diante de mim flutuaram, não havia fogo.